por Sigma Meteorologia | em Previsão | 03/02/2021 13:53

Maiores volumes de chuva e efeitos do Ciclone Extratropical devem ser sentidos em algumas áreas do Rio Grande do Sul e Uruguai

Atualizada às 15h32 minutos

A imagem de satélite do canal visível do início da tarde de hoje mostrava uma grande quantidade de nuvens sobretudo em áreas do RS e Uruguai onde chovia e muito em alguns pontos. Os pontos amarelos indicam a presença de descargas elétricas atmosféricas (raios). No PR, alguns núcleos isolados de verão se formavam.

O final da manhã/início da tarde desta quarta-feira transcorre sob condição de tempo instável em algumas regiões do Rio Grande do Sul, especialmente em áreas do sul, oeste e do centro gaúcho, onde ocorrem pancadas de chuva de fraca a moderada intensidade por vezes forte e acompanhada de algumas trovoadas, o que já proporciona bons acumulados de chuva nessas regiões. Nas demais áreas do estado, incluindo a metade norte, noroeste e nordeste e em Santa Catarina e no Paraná, o sol aparece em meio a pouca nebulosidade que combinado com o transporte de ar quente direcionado para a região, proporcionam uma jornada de calor e forte sensação de abafamento com marcas superiores aos 30°C em vários pontos.

Entre a tarde e a noite de hoje, o ar quente e úmido presente sobre o Sul do Brasil associado a um ambiente de menor pressão atmosférica com o aprofundamento de um sistema de baixa pressão entre o RS e Uruguai, dentre outros fatores, devem reforçar a formação de áreas de instabilidade sobre praticamente todas as áreas do RS onde há condição para chuva forte, pontualmente muito volumosa e acompanhada de trovoadas. Alguns temporais também podem se formar causando rajadas de vento mais fortes (> 70 km/h) e eventual precipitação de granizo em pontos isolados. Em áreas de SC e do PR, também há condição para instabilidade de verão com chuvas localizadas e temporais isolados entre a tarde e à noite de hoje. Entretanto, nesses dois estados as chuvas tendem a ocorrer num número pequeno de localidades e ser muito irregular e mal distribuída (chove num ponto e em outro muito próximo não).

Ao final da quarta e principalmente no decorrer da madrugada e manhã de quinta-feira, o rápido aprofundamento de um sistema de baixa pressão atmosférica e como consequência, a formação de um intenso Ciclone Extratropical próximo à costa uruguaia e gaúcha, deve contribuir para a formação e o rápido deslocamento de um sistema frontal frio (frente fria) por áreas do Sul do Brasil. Desta forma, espera-se chuva acompanhada de trovoadas em diversas áreas do Sul do país no período. No entanto, em função do rápido deslocamento do sistema, não se descarta a ocorrência de fortes rajadas de vento (> 70 km/h) associadas a formação de temporais isolados ao longo da frente fria.

A frente fria deve avançar tão rapidamente pelo Sul do Brasil, que ao final da quinta já terá chegado a áreas do Centro-Oeste e Sudeste do país, onde contribuirá para novos episódios de chuva forte e temporais isolados. Na retaguarda da frente fria, o Ciclone Extratropical já no Oceano Atlântico, deve impulsionar o ingresso de ar mais frio e seco pelo interior do continente associado a um sistema de alta pressão atmosférica que deve se aproximar pela costa da Argentina de maneira gradativa ao longo do dia. 

Desta forma, espera-se um predomínio de sol com variação de nebulosidade em trechos do oeste do RS, enquanto que regiões da metade leste gaúcha, incluindo áreas da Serra, Grande Porto Alegre e todo o litoral do RS ainda devem ter um dia com bastante nebulosidade, poucas aberturas de sol e pancadas de chuva a qualquer hora do dia. Sobre essas regiões, apesar das condições para temporais serem menores do que a quarta-feira, não dá pra descartar totalmente a ocorrência de pancadas de chuva com alguma trovoada.

Projeção de chuva acumulada (mm) entre hoje a noite de amanhã (04/02) por diferentes modelos de previsão do tempo.
Projeção média de chuva acumulada no mesmo período. Eventos pontuais, no entanto, podem causar precipitações consideravelmente mais altas do que o indicado por essa previsão.

Ciclone Extratropical 

Em relação ao ciclone extratropical, voltamos a reiterar o que muito falamos durante vídeos e lives ao longo dos últimos dias. Estes sistemas são comuns em regiões de latitudes médias e subtrópicos, como é o caso do RS, Uruguai e leste da Argentina. Não raro SC também. As regiões de latitudes médias possuem gradiente horizontal de temperatura mais acentuado (diferença horizontal de temperatura, no caso, norte-sul), necessária para ocorrência de instabilidade baroclínica (instabilidade dinâmica nos médios e altos níveis da atmosfera) e consequentemente de ciclones extratropicais. Fazem parte da climatologia destes lugares, ou seja, do que é normal e esperado para algumas épocas do ano nestas regiões. Ao contrário do que muitos pensam, ciclones não são punições da natureza e nem castigos divinos, são sistemas meteorológicos importantes para auxiliar na manutenção do equilíbrio energético do planeta. Outra coisa a ser salientada é que não necessariamente um ciclone provocará condições adversas de tempo, vai depender da localização, trajetória e intensidade.

Na noite desta quarta-feira, o sistema de baixa pressão sobre o RS que estava favorecendo a formação de instabilidades se desloca para o litoral sul gaúcho originando um ciclone extratropical. Uma vez configurado, deve se intensificar rapidamente à medida que se desloca para o alto mar e com potencial para se tornar explosivo. Contudo, é importante esclarecer e desmistificar o termo “explosivo” ou “bomba” que muito tem sido usado para causar alarmismos, sensacionalismos e fake news dentro da meteorologia nos últimos meses. Um ciclone para se tornar explosivo precisa apresentar uma taxa de decaimento da sua pressão central muito rápida em 24 horas e atingir um limiar X para aquela latitude para ser considerado explosivo. Na latitude 60° esse valor seria 24 hPa em 24 horas, porém, para a latitude 32/34°S (latitudes onde o ciclone deve se formar e se intensificar) é necessário entorno de 16 a 17 hPa, valor obtido seguindo equação proposta por Sanders e Gyakum (1980):

Δpc é a variação da pressão central em 24 horas e φ  é a latitude média do ciclone ao longo período (considerando a latitude inicial e a final durante o período)

Pelo modelo europeu ECMWF a queda seria de 1004 hPa, às 21 horas desta quarta-feira, para 981 hPa, às 21 horas de quinta-feira, portanto 23 hPa. Pelo modelo americano GFS 20 hPa e pelo alemão ICON 23 hPa.

No entanto, quando se fala em ciclone bomba o imaginário coletivo remete ao evento de 30/06/2020 quando SC foi atingida por ventos muito fortes que causaram grandes impactos. 

Na ocasião, como já falado várias vezes, as configurações sinóticas favoreceram que o ciclone se formasse sobre o Uruguai de forma que sua rampa frontal (frente fria) esteve sobre SC e ao se deslocar rapidamente favoreceu a formação de um derecho (sistema convectivo de mesoescala que provoca ventos destrutivos por pelo menos 400 km) trazendo transtornos ao estado catarinense. Este derecho causou ventos acima de 100 km/h em várias cidades, alguns locais acima dos 130 km/h. Portanto, um impacto indireto do ciclone. Algum tempo depois, já sobre o oceano e no dia 01/07 (um dia depois), o ciclone tornou-se explosivo e de forma direta trouxe algum impacto apenas ao leste do RS provocando ventos de 100/120 km/h.

Vento em 850 hPa do modelo global GFS referente ao evento ocorrido na tarde do dia 30/06/2020. A área demarcada em amarelo foi a região de formação do Derecho.
Vento em 850 hPa do modelo global GFS referente ao ciclone explosivo do dia 01/07/2020. A área demarcada em amarelo foi a região que teve impacto direto das rajadas de vento associadas ao  ciclone extratropical.

Dessa vez, a situação é totalmente diferente já que os ventos mais intensos são esperados para o alto-mar (como pode ser visto na figura abaixo). Nem de longe se espera severidade como foi observado naquela ocasião. Os ventos esperados ao longo da quinta-feira devem ficar entre 70/90 km/h no litoral sul e médio do RS e áreas da orla da Lagoa dos Patos, não se descartando de forma pontual valores próximos ou acima dos 100 km/h. Já em áreas da Campanha, Centro e Leste do RS valores entre 50/70 km/h, pontualmente acima. No litoral Norte do RS valores entre 60/80 km/h. Devido a influência do ciclone extratropical que estará atuando em alto mar, a Sigma Meteorologia não descarta condição para chuva torrencial acompanhada de rajadas de vento em áreas da região sul, sudeste (incluindo a Lagoa dos Patos) e extremo sul gaúcho. Portanto, são esperados acumulados de chuva que podem superar os 50 a 70 mm em poucas horas, situação que pode impactar em alagamentos nos centros urbanos.

Vento em 850 hPa do modelo global GFS referente a projeção do ciclone extratropical que vai atuar nesta quinta-feira (4) sobre o oceano atlântico. A área demarcada em amarelo será a região com maior impacto das rajadas de vento associadas diretamente ao ciclone extratropical.

Na sexta-feira, todo litoral do RS, orla das Lagoa dos Patos e litoral sul de SC (até a região de Florianópolis) espera-se um dia mais ventoso com rajadas entre 50/70 km/h. Portanto, o impacto do ciclone em SC se reduz a rajadas moderadas e restritas ao litoral Sul. Nem de longe espera-se adversidades como em 30/06. Além dos ventos, espera-se agitação marítima em todo litoral da região Sul. Dessa forma, é inapropriado para práticas esportivas e isso requer atenção aos navegadores.  

A Sigma Meteorologia reitera que existe risco de ventos fortes (70 km/h ou acima) em alguns pontos devido às instabilidades antes da frente fria e principalmente devido as instabilidades associadas ao avanço da frente fria, porém, são ventos não associados diretamente aos impactos do ciclone extratropical, já que os ventos causados pelo ciclone extratropical serão sentidos no decorrer da quinta-feira dentro dos ranges que foram especificados no parágrafo 10 desta matéria.

Projeção do modelo alemão ICON para rajadas de vento entre hoje e o próximo sábado.
Rajadas de vento projetadas pelo modelo Europeu (ECMWF) até a noite da próxima sexta-feira. Fonte: Weatherbell.
Projeção de ventos do modelo WRF 5km.
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